quinta-feira, 30 de abril de 2015

Cinema Veloz, Furioso e Monopólico

Crítica do filme Velozes e furiosos 7, publicada na Folha da Manhã em 24/04/2015




O escritor argentino Jorge Luis Borges, com a elegância e diplomacia que o caracterizava, dizia que quando você está lendo um livro com desprazer, deve abandoná-lo pois ele, naquele instante, não foi feito pra você.

Confesso que pensei nessa frase de Borges ao assistir “Velozes e furiosos 7”, adaptando-a da literatura para o cinema. Um filme que não tinha sido feito pra mim. E não porque o considerasse artisticamente inferior àquilo que poderia ser o meu ‘patamar cinéfilo’. Longe disso. Simplesmente porque é um tipo de cinema que não me causa prazer.

Entretanto, devo reconhecer que “Velozes 7” tem seus méritos. O primeiro (para os produtores) talvez seja a capacidade de manter a franquia no topo das bilheterias. Aqui no Brasil, na primeira semana de exibição levou mais de sete milhões de espectadores, ficando no alto do ranking dos filmes mais assistidos. Não apenas isso, “Velozes 7” superou “Tropa de elite 2” como o filme de maior renda na história do mercado nacional. O sucesso local inclusive supera, em termos proporcionais, o que vem acontecendo nos Estados Unidos.

Semelhante êxito não vem por acaso. Entre os fatores que ajudaram à assistência massiva de público certamente poderíamos apontar a morte de Paul Walker, o co-protagonista, que viera a falecer durante a rodagem, ainda na sua fase inicial (sua participação só pode ser ‘completada’ graças à tecnologia digital). A esse trágico acontecimento, se soma uma boa campanha de divulgação que deu a entender, espertamente, ser este o ultimo filme da saga. Diante do espetacular faturamento, receio que a contagem dos filmes “Velozes e furiosos” atinja os dois dígitos.

Mas não sejamos injustos: há fatores endógenos, próprios do filme, que contribuem para o seu sucesso. Entre eles devemos destacar as cenas de ação, é claro, recheadas de perseguições automobilísticas, explosões, lutas e disparos, e que foram realizadas com a perícia, o exagero e a grandiosidade que se espera nesta classe de histórias. Além disso, agregam-se ao elenco estável da série os nomes de Jason Statham (o astro daquela outra franquia chamada “Carga explosiva”) interpretando aqui o vilão, e Kurt Russell, cuja aparição funciona como uma espécie de homenagem àquela classe de filmes de ação que o astro interpretara na sua juventude, especialmente as “Fugas” de Nova York e Los Angeles, ambos de John Carpenter.

O roteiro, por sua vez, tem a astúcia suficiente para conceber uma história que justifique desde a variedade de paisagens e locações quanto as peripécias dos protagonistas, que deverão cumprir uma série de ‘trabalhos’ encomendados pelo suposto agente da CIA (Russell), com o objetivo final de derrotar o vingativo Deckard Shaw (Statham). De toda sorte, compreender os meandros da trama é totalmente prescindível.

A grande jogada dos produtores de Velozes talvez tenha sido saber mudar a natureza da franquia antes que esta se esgotasse. Até o quinto filme, tratavam-se das aventuras de um grupo de semi-marginais cuja paixão pelas corridas ilegais de rua os levavam a cometer diversos crimes, enquanto eram perseguidos por policiais infiltrados. A partir do sexto, a equipe de Dominic Toretto transformou-se num grupo altamente especializado na realização de ‘trabalhos’ por encomenda das autoridades, visando capturar outros bandidos mais perigosos.

A despeito do conselho de Borges, não posso apenas abandonar “Velozes 7” alegando não ser ele o tipo de filme pra mim. Em primeiro lugar porque a função de crítico me obriga a analisá-lo, entendê-lo e orientar o leitor para que saiba de que classe de filme se trata. Mas também porque não há para onde fugir: os filmes da categoria de “Velozes e furiosos” praticamente monopolizam as salas a nível mundial. Que fique claro: o problema não é que seja mau cinema (acho que não é); o problema é que seja o único cinema.

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